MARIA E SUA MISSÃO NA TERRA
PERGUNTA: —Por que motivos os Mestres Siderais escolheram o espírito de Maria, para ser mãe de Jesus?
RAMATíS: — O Alto escolheu Maria para essa missão porque se tratava de um espírito de absoluta humildade, terno e resignado, que não iria interferir na missão de Jesus. Ela seria a mãe ideal para ele, amorosa e paciente, sem as exigências despóticas dos caprichos pessoais; deixando-o, enfim, manifestar seus pensamentos em toda sua espontaneidade original. Aliás, ainda no Espaço, antes de Maria baixar à Terra, fora combinado que as inspirações e orientações na infância de Jesus seriam exercitadas diretamente do mundo invisível pelos seus próprios Anjos Tutelares.
Embora Jesus fosse um espírito sideralmente emancipado e impermeável a qualquer sugestão alheia capaz de desviá-lo do seu compromisso messiânico, é evidente que ele poderia ser afetado, em sua infância, por uma influência materna demasiadamente viril, dominadora egocêntrica, com sérios prejuízos para sua obra.
Muitos escritores, cientistas, líderes religiosos, poetas, pintores, músicos ou filósofos célebres tiveram sua vida bastante influenciada pelo domínio tirânico dos seus genitores, prejudicando de certo modo as qualidades extraordinárias de seus filhos.
Jesus teria de desempenhar um trabalho de sentido específico e de interesse comum a toda humanidade; seu tempo precioso não poderia ser desperdiçado no cultivo de qualidades artísticas, científicas ou em abstrações filosóficas do mundo profano. A sua obra seria prejudicada, caso seus pais tentassem impor-lhe rumos profissionais que alterassem os objetivos fundamentais da sua missão. Jesus precisaria crescer completamente livre e desenvolver suas forças espirituais de modo espontâneo, a fim de estruturar o seu ideal messiânico sem quaisquer deformações, desvios ou caprichos do mundo.
Jesus era um espírito de graduação angélica, distinto de todos os seus contemporâneos; e sua autoridade espiritual dava-lhe o direito de contrapor-se à própria família, desde que ela teimasse em afastá-lo do seu empreendimento messiânico! Eis, portanto, o motivo por que o Alto preferiu o espírito dócil e passivo de Maria, para a missão sublime de ser mãe do Messias, protegê-lo em sua infância e não turbar-lhe a missão de amplitude coletiva.
PERGUNTA: — Como entenderíamos melhor essa condição passiva de Maria em não intervir ou influir na formação psicológica de Jesus durante sua infância, sendo ela sua genitora?
RAMATÍS: — Maria era todo coração e pouco intelecto; um ser amorável, cujo sentimento se desenvolvera até à plenitude angélica. No entanto, ainda precisaria aprimorar a mente em encarnações futuras para completar o binômio "Razão-sentimento", que liberta definitivamente a alma do ciclo das encarnações humanas. Ademais, além de participar do programa messiânico de Jesus, ela também resolvera acolher sob o seu amor maternal algumas almas a que se ligara no passado, a fim de ajudá-las a melhorarem o seu padrão espiritual. Embora muito jovem e recém-casada, não se negou a criar os filhos do primeiro casamento de José, viúvo de Débora, e que trouxera para o novo lar cinco filhos menores: Matias, Cleofas, Eleazar, Jacó e Judas, estes dois últimos falecidos bem cedo. A exceção de Jesus, que era um missionário eleito, os demais filhos de José e Maria eram espíritos comprometidos por mútuas responsabilidades cármicas do passado, cuja existência em comum serviu para amenizar-lhes as obrigações espirituais recíprocas.
Maria era um espírito amoroso, terno e paciente, completamente liberta do personalismo tão próprio das almas primárias e sem se escravizar à ancestralidade da carne. Possuía virtudes excelsas oriundas do seu elevado grau espiritual. Cumpria seus deveres domésticos e se devotava heroicamente à criação da prole numerosa, tão despreocupada de sua própria ventura como o bom aluno que aceita as lições de alfabetização, mas não se escraviza à materialidade da escola. Oferecia de si toda ternura, paciência, resignação e humildade, sem quaisquer exigências pessoais.
Na época de Jesus, as escolas se multiplicavam em Jerusalém e mesmo pelas cidades adjacentes, pois ensinava-se em casa, nas ruas e nas sinagogas. No entanto o ensino se particularizava por uma imposição religiosa, pois tanto as crianças como os adultos, assim que aprendiam a ler devotavam-se a interpretar tudo o que se reportava à religião judaica. Eram estudos do culto, das concepções religiosas quanto às profecias e aos salmos, que transformavam cada alfabetizado em um novo cooperador intelectual e pessoal para o Templo. Sem dúvida, existiam estabelecimentos superiores, tais como as escolas rabínicas, na maioria filiadas à Escola de Hilel e preferida pelos fariseus, que ensinavam botânica, medicina, agricultura, higiene, direito, arquitetura etc. Mas as mulheres, afora o conhecimento primário para um entendimento razoável, eram destituídas de cultura geral. Maria, no entanto, era muitíssimo considerada em Nazaré, por ser exímia em bordados, costuras, tecelagem de tapetes de lã e cordas, cujo ofício aprendera durante sua estada entre as virgens de Sião, no Templo de Jerusalém. Ela aproveitava todos os instantes disponíveis para contribuir com suas prendas e confecções no orçamento da família, que era precário em face do trabalho modesto de José, na oficina de carpintaria.
Embora mulher meiga e amorosa, anjo exilado na Terra, em face de sua modesta cultura e falta de conhecimentos profundos da psicologia humana. Maria vivia o imediatismo das reações emotivas e sem as complexidades do intelecto. Mas era tão dadivosa ao próximo, assim como a fonte de água pura renova-se à medida que a esgotam; como a rosa que doa incondicionalmente o seu perfume, ela jamais se preocupava em saber qual o mecanismo que transforma o adubo do solo em fragrância tão odorante!
PERGUNTA: — Quereis dizer que devido ao seu temperamento meigo e generoso, Maria pôde viver longe dos conflitos tão comuns entre a vizinhança, mantendo-se imune aos problemas sentimentais da família? Não é assim?
RAMATíS: — Se o amor doado por uma só criatura fosse suficiente para eliminar as manifestações agressivas e desagradáveis do mundo tão primário, como é a Terra, é evidente que Jesus não seria crucificado, mas entusiasticamente consagrado pelos seus contemporâneos. Assim também acontecia com Maria, pois embora o seu amor intenso, incondicional e puro pudesse abrigar toda a família, os amigos, a vizinhança e até os estranhos, nem por isso pôde livrar-se de certa inveja, intriga, mesquinharia e ciúme de algumas almas de quilate inferior, que também viviam naquele mundículo de Nazaré.
E' certo que nas imediações do seu lar vivia o povo nazareno, tradicionalmente hospitaleiro, religioso e serviçal; mas esse ouro da alma ainda se achava impregnado da ganga inferior das paixões e dos interesses mesquinhos do inundo. A cupidez, inveja, falsidade e avareza e as murmurações malévolas às vezes também estendiam seus tentáculos, procurando turbar a paz do lar tranqüilo de Maria e José. Isso os obrigava a estóicas renúncias e abdicação do amor próprio, amenizando os mexericos da vizinhança, inquieta e rixenta. Só a ternura, a humildade, o amor e a paciência de Maria puderam transformar a intriga e o falatório tempestuoso de alguns, na brisa inofensiva da cordialidade. O seu sorriso angélico desfazia o ressentimento mais duro e abrandava o coração mais tirânico. Ela contornava com tal doçura os enredos de inveja e de ciúmes, a lhe rondarem o aconchego do lar amigo, que conseguia desarmar os intrigantes mais capciosos e renitentes.
A Galiléia não era um mundo de criaturas santificadas, só porque ali vivia Jesus, o Messias, pois não é o tipo de raça, a latitude geográfica ou a tradição histórica de um povo o que imprime na alma humana o selo da espiritualidade. Isso é obra da transformação, do apuro de sentimentos e da maturidade espiritual, efetuado no seio da alma, e não de acordo com a mudança do ambiente. A alma vil e inferior tanto é própria do povo chinês, polaco ou judeu, como do egípcio ou hindu! E o povo judeu, na época, a par de suas virtudes tradicionais e fé religiosa, era cúpido, fanático, avaro e rixento. Às vezes, o animal ou a ave inocente pagava com a vida o fim da discussão violenta que os seus donos empreendiam por "cima da cerca". Doutra feita, a rixa entre as crianças assumia tal dramaticidade, que mobilizava os pais para a troca de imprecações e insultos na defesa das tradições e dos preconceitos da família. E à semelhança do que ainda hoje acontece nos cortiços, às vezes, motivos sem importância terminavam em violento pu-gilato.
Felizmente, José, embora homem severo e intransigente, sabia amainar essas tempestades emotivas, aliando-se à mei-guice de Maria para sobrepairar acima dos mexericos perigosos. Malgrado tratar-se de uma família numerosa, aquele lar pobre, mas honesto, sustentou o clima psíquico adequado à eclosão das forças espirituais do Menino-Luz. Isto evitou desperdício de tempo e qualquer desvio na marcha messiânica do Mestre Amado.
Enquanto José se assemelhava ao carvalho vigoroso, sob cuja sombra protetora Jesus pôde crescer tranqüilo, Maria era como o sândalo a perfumar o machado da maledicência, intriga e mesquinharia humana, que às vezes tentava ferir-lhe o lar.
PERGUNTA: — Naturalmente, a passividade materna de Maria não só ajudou Jesus a crescer emancipado pelas suas próprias idéias, como também a desvencilhar-se mais cedo dos laços afetivos e sentimentalismos da parentela do mundo. Não é assim?
RAMATÍS: — Realmente, havia sido combinado no Espaço, entre os participantes mais íntimos da missão de Jesus, que ele teria de despertar suas próprias forças espirituais e sentimentos angélicos na carne, livre de quaisquer influências educativas alheias. Todavia, ser-lhe-ia proporcionado um ambiente familiar pacífico, compreensivo e seguro, para não lhe perturbar a infância. Em face da contextura espiritual superior de Jesus, os apóstolos e cooperadores de sua obra messiânica ainda eram incapacitados para traçar-lhe diretrizes melhores das que ele já planejara no imo de sua alma. Por isso, dispensou qualquer método disciplinador ou guia humano, que devesse orientá-lo no mundo durante os 33 anos de sua vida física. Os seus Anjos Tutelares sempre o desviaram de quaisquer empreendimentos ou gloriosas profanas, embora dignas e meritórias, mas capazes de algemá-lo às preocupações escravizantes da vida humana!
PERGUNTA: — Embora considerando-se a modéstia intelectual de Maria e o senso prático de José, não lhes teria sido possível perceberem a diferença da natureza espiritual incomum de Jesus, sobre os demais filhos? E isso não os faria se considerar mais venturosos?
RAMATÍS: — Nem sempre os rasgos de genialidade e os arroubos extraordinários dos filhos incomuns são motivos de ventura para os pais. Às vezes confundem arrebatamen-tos de sabedoria com excentricidades inexplicáveis. O certo é que Jesus, embora fosse um menino dócil, respeitoso e algo tímido, era um Espírito de estirpe sideral muito acima do mais alto índice de inteligência e capacidade do homem terreno. Por isso, mesmo ao período de sua infância, ele não se submetia aos padrões e preconceitos comuns da época, porque suas reações mentais e emotivas ultrapassavam as convenções comuns e o provincianismo do povo judeu. Ele não só causava espanto, mas até constrangimento entre os próprios companheiros de folguedos e as pessoas adultas, pois expunha idéias e conceitos bem mais avançados que o comum em seu tempo.
Em sua maneira pessoal de interpretar ou julgar as coisas de sua terra e de seu povo, o menino Jesus tinha respostas agudas e inteligentes, porém, honesto no seu falar e jamais contemporizando com a malícia, capciosidade, hipocrisia ou perversidade. Não era ofensivo, nem petulante; respondia a todos com singeleza, respeito e até com timidez; mas ninguém conseguia modificar-lhe o modo franco e sincero de dizer as coisas, pois ira inimigo de evasivas, rodeios ou acomodações interesseiras. Obediente ao seu inconfundível espírito de justiça, ele até seria contra a família e em favor do adversário, caso este tivesse razão! Afeiçoava-se facilmente a todos os seres e criaturas e os servia com o mesmo espírito de fraternidade e amor, pouco lhe importando a situação social ou humana. No entanto, suas atitudes francas e corajosas punham em choque até o espírito compreensivo de seus pais e semeavam indecisões entre os rabinos da Sinagoga. Muitas vezes, os adultos ficavam confusos ante a solução inesperada, de um nível de justiça acima do entendimento comum, que o menino Jesus expunha em suas dissertações vivas e eloqüentes.
Semelhante situação confundia os seus familiares mais íntimos, ainda imaturos e incapazes de entenderem a fala do anjo e do sábio sideral, que não se disfarça sob as sutilezas capciosas e próprias dos homens empenhados na luta pelos interesses humanos! O menino Jesus, genial e franco, jamais podia enquadrar-se no esquema prosaico da criança comum, cujas emoções e pensamentos são um reflexo dos costumes e preconceitos da sua época. Evidentemente, Maria e José não podiam entrever naquele filho singular o fulgor e a tempera do Messias, quando ele causava críticas e despertava censuras alheias pelos seus modos excêntricos ou estranhos! Ambos ainda não estavam capacitados para compreenderem uma conceituação moral tão-pura e tão impessoal do ser humano, contrária às tradições seculares da vida do povo judeu!
PERGUNTA: — Maria jamais acreditou na missão de seu filho Jesus, ou chegou a pressenti-la próximo de sua morte?
RAMATÍS: — Graças à sua natureza mediúnica, Maria recebeu inúmeros avisos e advertências do seu guia espiritual, o qual insistia em informá-la da estirpe angélica de seu filho. Mas em face de suas obrigações cotidianas junto à família numerosa, ela esqueceu, pouco a pouco, as mensagens mediúnicas que lhe foram transmitidas nas vésperas de casar e antes de nascer Jesus. Mais tarde, em alguns raros momentos, sentia-se dominada por essa reminiscência, quando uma voz oculta lhe parecia confabular quanto à natureza incomum de seu filho.
Quando Jesus deixou a família, decidindo-se pelas suas peregrinações através das estradas da Judéia e de outros lugares próximos, Maria esqueceu os últimos resquícios de lembranças que ainda pudessem avivar-lhe a crença dele ser um missionário. Após a morte de José, quando Jesus havia completado vinte e três anos, agravou-se o orçamento do lar e ela viu-se obrigada a mobilizar todos os esforços para superintender os gastos da família. Felizmente, meses depois, soube que Jesus chefiava um grupo de discípulos constituído por pescadores, camponeses, homens do povo e algumas mulheres devotas que o seguiam incendidas por um entusiasmo religioso contagiante! Maria não se surpreendeu com tais notícias e sentiu-se tranqüila por ver seu filho devotado à tarefa pacífica de rabi itinerante e participando da inspiração religiosa do seu povo. Isso o ajudaria a suavizar aquela inquietação estranha, o misticismo exagerado e a rebeldia aos costumes e tradições comuns.
Maria sentiu-se grata ao Senhor pelo ensejo de seu filho preferir a profissão liberal e religiosa de interpretar entre os seus conterrâneos as regras e o repositório da sabedoria de Moisés. Mas os irmãos de Jesus, afora Eleazar, filho de José e Débora, e mais tarde Tiago, o menor, não lhe apreciaram devidamente a tarefa de rabi das estradas, pois isso não contribuía de modo algum para o orçamento precário da família. Acoimavam-no de chefe de uma corte de malandros e curiosos, que sonhavam entusiasticamente com um reino cômodo e próspero sem ficar devendo obrigações. Matias, Cleofas, conhecido por Simão, Eleazar e Elisabete já haviam casado e cooperavam na receita financeira e ajudavam Maria, já com 47 anos de idade, mas ainda se mostrava sadia e moça. No entanto, ela não escondia a sua afeição incondicional por Jesus, Espírito a que se sentia afeiçoada no imo da alma há muitos milênios. Por isso o desculpava e o defendia, malgrado as intrigas e a maledicência geradas pelos despeitados, a seu respeito.
Mas, à medida que se aproximava o término da missão de Jesus, embora ela ignorasse isso em vigília, uma estranha melancolia e esquisito sofrimento lhe invadia a alma. Súbito, sua alegria se transformava em temor; uma incontida dor lhe tomava o peito e desejaria espantar de si uma visão oculta que receava enfrentar na realidade. Inconscientemente, Maria se preparava para testemunhar os quadros mais dolorosos de sua vida, que seriam o martírio e á crucificação do seu querido filho, isento de culpa e de maldade! Alguns o chamavam de profeta de Israel, outros de Libertador do povo judeu; porém, havia os que o diziam um louco ou imbecil, enquanto o Sinedrio espionava, tentando conhecer-lhe os projetos aparentemente sediciosos. Era, pois, um santo para uns ou perigoso anarquista para outros! obviamente, não havia razões plausíveis e justificações capazes de convencer Maria quanto à gloriosa missão espiritual de seu extremado filho, assim como a família do príncipe Sáquia-Múni jamais previu que o seu descendente seria Buda, o Iluminado Instrutor moral da Ásia! Enfim, Jesus talvez não passasse de um modesto Rabi da Galiléia, entusiasmado pela obstinação de salvar os homens e redimir os pecados do mundo, conduzindo-os para um fantasioso reino semelhante à pátria de Israel! No entanto, quando ele, humilde e dócil como um cordeiro, aceitou o seu destino cruento sem mover os lábios, na mais silenciosa queixa, Maria, então, pôde reconhecer ali no sacrifício da cruz o Messias — o Salvador dos homens!
RAMATíS: — O Alto escolheu Maria para essa missão porque se tratava de um espírito de absoluta humildade, terno e resignado, que não iria interferir na missão de Jesus. Ela seria a mãe ideal para ele, amorosa e paciente, sem as exigências despóticas dos caprichos pessoais; deixando-o, enfim, manifestar seus pensamentos em toda sua espontaneidade original. Aliás, ainda no Espaço, antes de Maria baixar à Terra, fora combinado que as inspirações e orientações na infância de Jesus seriam exercitadas diretamente do mundo invisível pelos seus próprios Anjos Tutelares.
Embora Jesus fosse um espírito sideralmente emancipado e impermeável a qualquer sugestão alheia capaz de desviá-lo do seu compromisso messiânico, é evidente que ele poderia ser afetado, em sua infância, por uma influência materna demasiadamente viril, dominadora egocêntrica, com sérios prejuízos para sua obra.
Muitos escritores, cientistas, líderes religiosos, poetas, pintores, músicos ou filósofos célebres tiveram sua vida bastante influenciada pelo domínio tirânico dos seus genitores, prejudicando de certo modo as qualidades extraordinárias de seus filhos.
Jesus teria de desempenhar um trabalho de sentido específico e de interesse comum a toda humanidade; seu tempo precioso não poderia ser desperdiçado no cultivo de qualidades artísticas, científicas ou em abstrações filosóficas do mundo profano. A sua obra seria prejudicada, caso seus pais tentassem impor-lhe rumos profissionais que alterassem os objetivos fundamentais da sua missão. Jesus precisaria crescer completamente livre e desenvolver suas forças espirituais de modo espontâneo, a fim de estruturar o seu ideal messiânico sem quaisquer deformações, desvios ou caprichos do mundo.
Jesus era um espírito de graduação angélica, distinto de todos os seus contemporâneos; e sua autoridade espiritual dava-lhe o direito de contrapor-se à própria família, desde que ela teimasse em afastá-lo do seu empreendimento messiânico! Eis, portanto, o motivo por que o Alto preferiu o espírito dócil e passivo de Maria, para a missão sublime de ser mãe do Messias, protegê-lo em sua infância e não turbar-lhe a missão de amplitude coletiva.
PERGUNTA: — Como entenderíamos melhor essa condição passiva de Maria em não intervir ou influir na formação psicológica de Jesus durante sua infância, sendo ela sua genitora?
RAMATÍS: — Maria era todo coração e pouco intelecto; um ser amorável, cujo sentimento se desenvolvera até à plenitude angélica. No entanto, ainda precisaria aprimorar a mente em encarnações futuras para completar o binômio "Razão-sentimento", que liberta definitivamente a alma do ciclo das encarnações humanas. Ademais, além de participar do programa messiânico de Jesus, ela também resolvera acolher sob o seu amor maternal algumas almas a que se ligara no passado, a fim de ajudá-las a melhorarem o seu padrão espiritual. Embora muito jovem e recém-casada, não se negou a criar os filhos do primeiro casamento de José, viúvo de Débora, e que trouxera para o novo lar cinco filhos menores: Matias, Cleofas, Eleazar, Jacó e Judas, estes dois últimos falecidos bem cedo. A exceção de Jesus, que era um missionário eleito, os demais filhos de José e Maria eram espíritos comprometidos por mútuas responsabilidades cármicas do passado, cuja existência em comum serviu para amenizar-lhes as obrigações espirituais recíprocas.
Maria era um espírito amoroso, terno e paciente, completamente liberta do personalismo tão próprio das almas primárias e sem se escravizar à ancestralidade da carne. Possuía virtudes excelsas oriundas do seu elevado grau espiritual. Cumpria seus deveres domésticos e se devotava heroicamente à criação da prole numerosa, tão despreocupada de sua própria ventura como o bom aluno que aceita as lições de alfabetização, mas não se escraviza à materialidade da escola. Oferecia de si toda ternura, paciência, resignação e humildade, sem quaisquer exigências pessoais.
Na época de Jesus, as escolas se multiplicavam em Jerusalém e mesmo pelas cidades adjacentes, pois ensinava-se em casa, nas ruas e nas sinagogas. No entanto o ensino se particularizava por uma imposição religiosa, pois tanto as crianças como os adultos, assim que aprendiam a ler devotavam-se a interpretar tudo o que se reportava à religião judaica. Eram estudos do culto, das concepções religiosas quanto às profecias e aos salmos, que transformavam cada alfabetizado em um novo cooperador intelectual e pessoal para o Templo. Sem dúvida, existiam estabelecimentos superiores, tais como as escolas rabínicas, na maioria filiadas à Escola de Hilel e preferida pelos fariseus, que ensinavam botânica, medicina, agricultura, higiene, direito, arquitetura etc. Mas as mulheres, afora o conhecimento primário para um entendimento razoável, eram destituídas de cultura geral. Maria, no entanto, era muitíssimo considerada em Nazaré, por ser exímia em bordados, costuras, tecelagem de tapetes de lã e cordas, cujo ofício aprendera durante sua estada entre as virgens de Sião, no Templo de Jerusalém. Ela aproveitava todos os instantes disponíveis para contribuir com suas prendas e confecções no orçamento da família, que era precário em face do trabalho modesto de José, na oficina de carpintaria.
Embora mulher meiga e amorosa, anjo exilado na Terra, em face de sua modesta cultura e falta de conhecimentos profundos da psicologia humana. Maria vivia o imediatismo das reações emotivas e sem as complexidades do intelecto. Mas era tão dadivosa ao próximo, assim como a fonte de água pura renova-se à medida que a esgotam; como a rosa que doa incondicionalmente o seu perfume, ela jamais se preocupava em saber qual o mecanismo que transforma o adubo do solo em fragrância tão odorante!
PERGUNTA: — Quereis dizer que devido ao seu temperamento meigo e generoso, Maria pôde viver longe dos conflitos tão comuns entre a vizinhança, mantendo-se imune aos problemas sentimentais da família? Não é assim?
RAMATíS: — Se o amor doado por uma só criatura fosse suficiente para eliminar as manifestações agressivas e desagradáveis do mundo tão primário, como é a Terra, é evidente que Jesus não seria crucificado, mas entusiasticamente consagrado pelos seus contemporâneos. Assim também acontecia com Maria, pois embora o seu amor intenso, incondicional e puro pudesse abrigar toda a família, os amigos, a vizinhança e até os estranhos, nem por isso pôde livrar-se de certa inveja, intriga, mesquinharia e ciúme de algumas almas de quilate inferior, que também viviam naquele mundículo de Nazaré.
E' certo que nas imediações do seu lar vivia o povo nazareno, tradicionalmente hospitaleiro, religioso e serviçal; mas esse ouro da alma ainda se achava impregnado da ganga inferior das paixões e dos interesses mesquinhos do inundo. A cupidez, inveja, falsidade e avareza e as murmurações malévolas às vezes também estendiam seus tentáculos, procurando turbar a paz do lar tranqüilo de Maria e José. Isso os obrigava a estóicas renúncias e abdicação do amor próprio, amenizando os mexericos da vizinhança, inquieta e rixenta. Só a ternura, a humildade, o amor e a paciência de Maria puderam transformar a intriga e o falatório tempestuoso de alguns, na brisa inofensiva da cordialidade. O seu sorriso angélico desfazia o ressentimento mais duro e abrandava o coração mais tirânico. Ela contornava com tal doçura os enredos de inveja e de ciúmes, a lhe rondarem o aconchego do lar amigo, que conseguia desarmar os intrigantes mais capciosos e renitentes.
A Galiléia não era um mundo de criaturas santificadas, só porque ali vivia Jesus, o Messias, pois não é o tipo de raça, a latitude geográfica ou a tradição histórica de um povo o que imprime na alma humana o selo da espiritualidade. Isso é obra da transformação, do apuro de sentimentos e da maturidade espiritual, efetuado no seio da alma, e não de acordo com a mudança do ambiente. A alma vil e inferior tanto é própria do povo chinês, polaco ou judeu, como do egípcio ou hindu! E o povo judeu, na época, a par de suas virtudes tradicionais e fé religiosa, era cúpido, fanático, avaro e rixento. Às vezes, o animal ou a ave inocente pagava com a vida o fim da discussão violenta que os seus donos empreendiam por "cima da cerca". Doutra feita, a rixa entre as crianças assumia tal dramaticidade, que mobilizava os pais para a troca de imprecações e insultos na defesa das tradições e dos preconceitos da família. E à semelhança do que ainda hoje acontece nos cortiços, às vezes, motivos sem importância terminavam em violento pu-gilato.
Felizmente, José, embora homem severo e intransigente, sabia amainar essas tempestades emotivas, aliando-se à mei-guice de Maria para sobrepairar acima dos mexericos perigosos. Malgrado tratar-se de uma família numerosa, aquele lar pobre, mas honesto, sustentou o clima psíquico adequado à eclosão das forças espirituais do Menino-Luz. Isto evitou desperdício de tempo e qualquer desvio na marcha messiânica do Mestre Amado.
Enquanto José se assemelhava ao carvalho vigoroso, sob cuja sombra protetora Jesus pôde crescer tranqüilo, Maria era como o sândalo a perfumar o machado da maledicência, intriga e mesquinharia humana, que às vezes tentava ferir-lhe o lar.
PERGUNTA: — Naturalmente, a passividade materna de Maria não só ajudou Jesus a crescer emancipado pelas suas próprias idéias, como também a desvencilhar-se mais cedo dos laços afetivos e sentimentalismos da parentela do mundo. Não é assim?
RAMATÍS: — Realmente, havia sido combinado no Espaço, entre os participantes mais íntimos da missão de Jesus, que ele teria de despertar suas próprias forças espirituais e sentimentos angélicos na carne, livre de quaisquer influências educativas alheias. Todavia, ser-lhe-ia proporcionado um ambiente familiar pacífico, compreensivo e seguro, para não lhe perturbar a infância. Em face da contextura espiritual superior de Jesus, os apóstolos e cooperadores de sua obra messiânica ainda eram incapacitados para traçar-lhe diretrizes melhores das que ele já planejara no imo de sua alma. Por isso, dispensou qualquer método disciplinador ou guia humano, que devesse orientá-lo no mundo durante os 33 anos de sua vida física. Os seus Anjos Tutelares sempre o desviaram de quaisquer empreendimentos ou gloriosas profanas, embora dignas e meritórias, mas capazes de algemá-lo às preocupações escravizantes da vida humana!
PERGUNTA: — Embora considerando-se a modéstia intelectual de Maria e o senso prático de José, não lhes teria sido possível perceberem a diferença da natureza espiritual incomum de Jesus, sobre os demais filhos? E isso não os faria se considerar mais venturosos?
RAMATÍS: — Nem sempre os rasgos de genialidade e os arroubos extraordinários dos filhos incomuns são motivos de ventura para os pais. Às vezes confundem arrebatamen-tos de sabedoria com excentricidades inexplicáveis. O certo é que Jesus, embora fosse um menino dócil, respeitoso e algo tímido, era um Espírito de estirpe sideral muito acima do mais alto índice de inteligência e capacidade do homem terreno. Por isso, mesmo ao período de sua infância, ele não se submetia aos padrões e preconceitos comuns da época, porque suas reações mentais e emotivas ultrapassavam as convenções comuns e o provincianismo do povo judeu. Ele não só causava espanto, mas até constrangimento entre os próprios companheiros de folguedos e as pessoas adultas, pois expunha idéias e conceitos bem mais avançados que o comum em seu tempo.
Em sua maneira pessoal de interpretar ou julgar as coisas de sua terra e de seu povo, o menino Jesus tinha respostas agudas e inteligentes, porém, honesto no seu falar e jamais contemporizando com a malícia, capciosidade, hipocrisia ou perversidade. Não era ofensivo, nem petulante; respondia a todos com singeleza, respeito e até com timidez; mas ninguém conseguia modificar-lhe o modo franco e sincero de dizer as coisas, pois ira inimigo de evasivas, rodeios ou acomodações interesseiras. Obediente ao seu inconfundível espírito de justiça, ele até seria contra a família e em favor do adversário, caso este tivesse razão! Afeiçoava-se facilmente a todos os seres e criaturas e os servia com o mesmo espírito de fraternidade e amor, pouco lhe importando a situação social ou humana. No entanto, suas atitudes francas e corajosas punham em choque até o espírito compreensivo de seus pais e semeavam indecisões entre os rabinos da Sinagoga. Muitas vezes, os adultos ficavam confusos ante a solução inesperada, de um nível de justiça acima do entendimento comum, que o menino Jesus expunha em suas dissertações vivas e eloqüentes.
Semelhante situação confundia os seus familiares mais íntimos, ainda imaturos e incapazes de entenderem a fala do anjo e do sábio sideral, que não se disfarça sob as sutilezas capciosas e próprias dos homens empenhados na luta pelos interesses humanos! O menino Jesus, genial e franco, jamais podia enquadrar-se no esquema prosaico da criança comum, cujas emoções e pensamentos são um reflexo dos costumes e preconceitos da sua época. Evidentemente, Maria e José não podiam entrever naquele filho singular o fulgor e a tempera do Messias, quando ele causava críticas e despertava censuras alheias pelos seus modos excêntricos ou estranhos! Ambos ainda não estavam capacitados para compreenderem uma conceituação moral tão-pura e tão impessoal do ser humano, contrária às tradições seculares da vida do povo judeu!
PERGUNTA: — Maria jamais acreditou na missão de seu filho Jesus, ou chegou a pressenti-la próximo de sua morte?
RAMATÍS: — Graças à sua natureza mediúnica, Maria recebeu inúmeros avisos e advertências do seu guia espiritual, o qual insistia em informá-la da estirpe angélica de seu filho. Mas em face de suas obrigações cotidianas junto à família numerosa, ela esqueceu, pouco a pouco, as mensagens mediúnicas que lhe foram transmitidas nas vésperas de casar e antes de nascer Jesus. Mais tarde, em alguns raros momentos, sentia-se dominada por essa reminiscência, quando uma voz oculta lhe parecia confabular quanto à natureza incomum de seu filho.
Quando Jesus deixou a família, decidindo-se pelas suas peregrinações através das estradas da Judéia e de outros lugares próximos, Maria esqueceu os últimos resquícios de lembranças que ainda pudessem avivar-lhe a crença dele ser um missionário. Após a morte de José, quando Jesus havia completado vinte e três anos, agravou-se o orçamento do lar e ela viu-se obrigada a mobilizar todos os esforços para superintender os gastos da família. Felizmente, meses depois, soube que Jesus chefiava um grupo de discípulos constituído por pescadores, camponeses, homens do povo e algumas mulheres devotas que o seguiam incendidas por um entusiasmo religioso contagiante! Maria não se surpreendeu com tais notícias e sentiu-se tranqüila por ver seu filho devotado à tarefa pacífica de rabi itinerante e participando da inspiração religiosa do seu povo. Isso o ajudaria a suavizar aquela inquietação estranha, o misticismo exagerado e a rebeldia aos costumes e tradições comuns.
Maria sentiu-se grata ao Senhor pelo ensejo de seu filho preferir a profissão liberal e religiosa de interpretar entre os seus conterrâneos as regras e o repositório da sabedoria de Moisés. Mas os irmãos de Jesus, afora Eleazar, filho de José e Débora, e mais tarde Tiago, o menor, não lhe apreciaram devidamente a tarefa de rabi das estradas, pois isso não contribuía de modo algum para o orçamento precário da família. Acoimavam-no de chefe de uma corte de malandros e curiosos, que sonhavam entusiasticamente com um reino cômodo e próspero sem ficar devendo obrigações. Matias, Cleofas, conhecido por Simão, Eleazar e Elisabete já haviam casado e cooperavam na receita financeira e ajudavam Maria, já com 47 anos de idade, mas ainda se mostrava sadia e moça. No entanto, ela não escondia a sua afeição incondicional por Jesus, Espírito a que se sentia afeiçoada no imo da alma há muitos milênios. Por isso o desculpava e o defendia, malgrado as intrigas e a maledicência geradas pelos despeitados, a seu respeito.
Mas, à medida que se aproximava o término da missão de Jesus, embora ela ignorasse isso em vigília, uma estranha melancolia e esquisito sofrimento lhe invadia a alma. Súbito, sua alegria se transformava em temor; uma incontida dor lhe tomava o peito e desejaria espantar de si uma visão oculta que receava enfrentar na realidade. Inconscientemente, Maria se preparava para testemunhar os quadros mais dolorosos de sua vida, que seriam o martírio e á crucificação do seu querido filho, isento de culpa e de maldade! Alguns o chamavam de profeta de Israel, outros de Libertador do povo judeu; porém, havia os que o diziam um louco ou imbecil, enquanto o Sinedrio espionava, tentando conhecer-lhe os projetos aparentemente sediciosos. Era, pois, um santo para uns ou perigoso anarquista para outros! obviamente, não havia razões plausíveis e justificações capazes de convencer Maria quanto à gloriosa missão espiritual de seu extremado filho, assim como a família do príncipe Sáquia-Múni jamais previu que o seu descendente seria Buda, o Iluminado Instrutor moral da Ásia! Enfim, Jesus talvez não passasse de um modesto Rabi da Galiléia, entusiasmado pela obstinação de salvar os homens e redimir os pecados do mundo, conduzindo-os para um fantasioso reino semelhante à pátria de Israel! No entanto, quando ele, humilde e dócil como um cordeiro, aceitou o seu destino cruento sem mover os lábios, na mais silenciosa queixa, Maria, então, pôde reconhecer ali no sacrifício da cruz o Messias — o Salvador dos homens!
RAMATÍS