EXPERIÊNCIAS PRÓXIMAS À MORTE
Em meados dos anos 70, a investigação científica da vida após a morte ganhou um novo e poderoso aliado com as pesquisas do dr. Raymond Moody Jr. envolvendo pessoas consideradas clinicamente mortas.
A preocupação em desvendar o que existe depois da morte talvez seja uma das mais antigas da história humana, originando vários tratados filosóficos, esotéricos, religiosos, científicos e uma infinidade de discussões. Contudo, nos anos 70 do século XX, essas discussões começaram a pisar em terreno mais firme com a publicação do livro Vida Depois da Vida (Life After Life, 1975), do psicólogo e filósofo Raymond Moody. Nesse trabalho, ele apresentou dezenas de relatos fornecidos por pacientes que, durante alguns minutos, foram declarados como clinicamente mortos, e voltaram a viver.
Esse tipo de acontecimento ficou conhecido como EPM (Experiências Próximas à Morte), ou ainda EQM (Experiências de Quase-Morte). O dr. Moody deixou claro que não estava tentando provar a existência da vida depois da morte e nem considerava que fosse isso possível, pelo menos no atual estágio das pesquisas científicas. Outros estudiosos da área, como a dra. Elisabeth Kubler-Ross, receberam o livro com grande entusiasmo, acreditando que as experiências ali apresentadas confirmavam o que o espiritualismo vem afirmando há milhares de anos: existe vida após a morte.
Hoje, a descrição básica do que acontece com esses pacientes é mais conhecida graças à quantidade de livros e também de filmes que trataram do tema. Segundo o dr. Moody, nas EPMs existem inúmeros pontos de similaridade, independentemente das pessoas envolvidas, de seu grau de conhecimento ou cultura. "Tenho recebido relatos da China, Japão, Índia", explica Raymond Moody, "de pacientes e médicos que estudaram inúmeros casos. Existem antropólogos que encontraram EPMs em populações que sequer conheciam a escrita. As experiências eram muito parecidas com aquelas presenciadas nos prontos-socorros das grandes cidades".
O médico e pesquisador identificou quinze elementos presentes em quase todos os relatos, mas ressaltou que, apesar da semelhança, não existem dois exatamente iguais. Da mesma forma, ninguém chegou a vivenciar todos os quinze – algumas pessoas identificaram no máximo doze – e a ordem em que surgiram nem sempre foi a mesma.
Estágios
Os quinze elementos ou estágios que o dr. Moody encontrou e que são apresentados em seu livro Vida Depois da Vida são:
Inefabilidade – as pessoas costumam dizer que não conseguem explicar o que sentiram. O dr. Moody entende que a compreensão da linguagem depende de uma série de vivências comuns das quais todos participam. Como a EPM não faz parte de nosso dia-a-dia, os que passaram por ela não sabem como explicar a experiência pela qual passaram.
Ouvir a notícia – é comum alguém acidentado ou em uma mesa de operações ouvir o médico ou outra pessoa no local declará-lo morto.
Sentimentos de paz e quietude – geralmente, após um momento de dor causada por um grave ferimento ou outro problema físico, a pessoa tem uma sensação extremamente agradável logo no primeiro estágio da experiência.
O ruído – os primeiros momentos podem ser acompanhados de ruídos desagradáveis ou sons de campainha muito altos. Em alguns casos, esses ruídos podem ser agradáveis, até mesmo algum tipo de música.
O túnel escuro – certas pessoas sentiram, junto com os ruídos, a sensação de estarem sendo puxadas por um túnel escuro e longo, ou através de um espaço vazio, negro.
Fora do corpo – após a experiência no túnel escuro a pessoa sente-se fora do corpo, olhando para sua forma física como se fosse outra pessoa. Ela também percebe tudo que acontece à sua volta, e o estado emocional varia de pessoa para pessoa: alguns ficam confusos e preocupados, querendo voltar ao corpo, mas sem saber como; outros não sentem medo e se dão conta do que está acontecendo, mantendo-se calmos. É comum a pessoa perceber que está morta e notar as qualidades de seu novo "corpo", que ninguém vê, e que começa a flutuar. A pessoa também pode ter uma noção do tempo totalmente diferente.
Encontrando outras pessoas – muitos dos que passaram pela EPM tiveram consciência de que outras pessoas ou o que chamaram de "seres espirituais" estavam no local para ajudar na passagem para o outro lado, ou para dizer que a hora da pessoa ainda não havia chegado. Alguns encontraram familiares ou amigos que tiveram em vida; outros viram pessoas totalmente desconhecidas.
O ser de luz – o encontro com a Luz é considerado o elemento mais marcante das experiências. Ela surge como uma suave claridade que se vai intensificando até tornar-se totalmente brilhante, mas sem prejudicar a visão. Essa Luz é descrita como um ser, do qual emana um amor impossível de ser descrito e que atrai as pessoas de forma irresistível. Nesse caso específico, a descrição do ser varia de acordo com as crenças religiosas. Em seguida, a entidade começa a se comunicar, a perguntar o que a pessoa fez de sua vida sem o menor tom recriminatório. Isso acontece por intermédio do pensamento, sem que seja possível qualquer engano ou mentira na comunicação.
A recapitulação – o contato com o ser de luz desencadeia uma recapitulação visual da vida da pessoa, não com o objetivo de julgar ou de conhecê-la, mas para provocar uma reflexão. Além das imagens serem extremamente reais, ela surgem todas de uma vez, como se toda uma vida se passasse num instante.
A barreira ou limite – muitos relataram a impressão de estar se aproximando de uma espécie de barreira ou fronteira que, dependendo da pessoa, se apresentava de forma diferente: uma porta, uma névoa, uma extensão de água.
Regresso – o momento em que se inicia a volta ao corpo físico geralmente é o mais complicado. Após os momentos iniciais, em que existe a vontade de retornar ao corpo físico, no restante da experiência as pessoas se acostumam ao ambiente e chegam a não querer mais voltar. Essa situação é acentuada nos que vêem o ser de luz.
Contar aos outros – quem passa por uma EPM não a descreve como um sonho, mas como uma experiência real e importante. A pessoa também entende que seus relatos, de forma geral, não serão bem aceitos pelos outros, e muitas vezes ela se cala para não ser considerada louca. Alguns preferem não falar sobre o assunto por achar que a experiência pela qual passaram não pode ser descrita pela nossa linguagem.
Efeito sobre a vida – apesar da resistência em falar sobre o assunto, a maioria sente que suas vidas foram modificadas, ampliadas pela experiência. Elas passam a buscar um sentido mais espiritual ou dão mais valor à existência humana, e quase todas ressaltam a importância de cultivar o amor pelo próximo.
Nova visão da morte – geralmente, quem passa pela EPM deixa de ter medo da morte física. Não que elas procurem a morte ou deixem de temer o sofrimento que certas formas de morrer podem causar – elas perdem o medo do que vai acontecer depois. O suicídio também é desaconselhado por todas como forma de chegar ao lugar do qual tiveram um vislumbre. Elas passam a ver a vida pós-morte como uma continuação desta, na qual as pessoas seguem aprendendo.
Corroboração – uma questão importante se refere à possibilidade de obter provas de que a pessoa realmente teve uma EPM. Na pesquisa do dr. Moody, ele obteve vários relatos de gente que soube repetir tudo o que estava acontecendo à sua volta durante a EPM e, em alguns casos, até em aposentos distantes.
Críticas
Alguns médicos e cientistas dizem que a experiência de quase-morte é só o resultado da falta de oxigênio no cérebro, mas o dr. Moody não concorda. "Também pensei que fosse isso", ele explica. "Sei de muitos médicos do mundo todo que investigaram o fenômeno partindo desse princípio, mas depois de falar com os pacientes, todos acabaram mudando de opinião. A definição clássica de alucinação implica que a pessoa esteja vendo ou ouvindo algo que não existe. Nas experiências próximas à morte tivemos vários casos de pacientes que, enquanto estavam fora do corpo, observavam o que ocorria fora da sala. Isso não poderia ser explicado por um mero efeito fisiológico ou bioquímico".
Ultimamente, o número de relatos sobre as EPMs aumentou consideravelmente e, segundo o dr. Moody, isso se deve ao avanço médico e às refinadas técnicas de ressuscitação. O dr. Fred Schoonmaker, chefe de medicina cardiovascular do maior hospital de Denver, entrevistou um grande número de pacientes que ele próprio ressuscitou, e descobriu que 60% haviam tido a experiência. “Pode-se comparar esse número”, ele explica, “com o do levantamento dos drs. Ken Ring e Mike Sabom. Eles estudaram um grupo de pacientes que, embora inconscientes e perto da morte, apresentavam um quadro clínico menos grave. Nesse grupo, 45% tiveram as experiências”.
Os dados podem ser importantes, segundo o dr. Raymond Moody, mas não ajudam a entender por que alguns têm a experiência e outros não. “Os fatores que poderiam estar correlacionados – como idade, doença ou traumatismo que quase levou à morte, sexo, crença religiosa e assim por diante – não parecem fazer qualquer diferença. Num estudo realizado há alguns anos, o dr. Bruce Grayson reuniu algumas evidências de que um fator decisivo é o paciente se entregar ou não no momento. Ele acredita que certos pacientes chegam a um ponto em que simplesmente aceitam a morte, e são estes que vivem a plenitude da experiência”.
Vidas Passadas
Ultimamente, o dr. Raymond Moody tem se dedicado bastante ao estudo da regressão a vidas passadas e desenvolveu sua própria teoria sobre a reencarnação, que ele entende como uma metáfora e à qual se refere com certo cuidado. “Eu não sei se reencarnação existe de fato”, ele explica. “Do ponto de vista científico, das evidências, não posso afirmar que sim, nem que não. Do ponto de vista dos meus sentimentos e intuição, eu diria que existe. Na dimensão em que vivemos, usamos uma forma linear de expressão e para elaborar conceitos. Conceitos como linha do tempo, causa e efeito, etc. são completamente diferentes. Talvez a reencarnação seja um processo muito mais complexo do que possamos imaginar”.
O dr. Moody também diz ter visto a regressão a vidas passadas fazer muito bem às pessoas. “Quando comecei a estudar o assunto eu abordava a regressão como um estado alterado de consciência e me surpreendi quando, ao me aprofundar, vi pessoas que passaram pelo processo, se sentirem muito beneficiadas, entendendo melhor certas dificuldades e conflitos que têm na vida”.
Mas o foco central de seu trabalho continua sendo as experiências de quase-morte. Mais de vinte e cinco anos após a publicação de seu primeiro livro sobre o assunto, Raymond Moody acredita que a sociedade está aceitando a discussão do tema com mais facilidade. “Estive recentemente em oito países da Europa e, em cada um, médicos me trouxeram artigos que tinham escrito para publicações científicas locais relatando suas pesquisas com EPMs.”
O próximo passo deverá ser a interpretação das experiências, ou seja, entender seu verdadeiro significado. “Isso nem é um assunto para a comunidade médica resolver”, ele entende. “Não cabe aos médicos definir se existe vida após a morte. O que interessa à medicina é que, independentemente das interpretações que se dê às EPMs, elas realmente ocorrem. Nós devemos estar preparados para discutir o fato com os pacientes e lhes dar todo o apoio possível”.