Domingo, 09 De Janeiro,2011

LICENÇAS PERNICIOSAS

 

         O homem do mundo que é possuidor de sensatez, na convivência mundana usa mas não abusa, concorda mas não convive, ensina mas não impõe, discorda mas não se inimiza, diverge mas não dissente, mantendo em todos os momentos uma diretriz de equilíbrio que o torna verdadeiro cidadão. Compreende que a sua saúde interior resulta do comportamento que se aplica na convivência com os seus pares.

         O homem cristão, cultor sincero do Evangelho de Jesus cristo, compreende em maior profundidade os compromissos que lhe assinalam a rota e por isto mesmo sabe que é livre, mas não tem licença de se comprometer com as vinculações negativas da vida, que lhe cumpre superar. Diante das licenciosidades que lhe abrem portas convidativas ao acesso, mantém uma atitude digna, discreta, sem envolver-se nas fantasias que levam à indigência espiritual e compelem ao aniquilamento dos ideais superiores da vida. Sente-se escravo da verdade, por isso não mente. Compreende que a saúde é fator primacial da vida, portanto, luta contra a doença. No báratro das violações que se multiplicam, galvanizantes ou douradas, percebe o lado negativo das concessões agradáveis que levam à sensualidade - bafio pestilencial de morte que entorpece o sentimento e perturba a razão. - Abstém-se de enrodilhar-se nas malhas constritoras do mal que urde toda uma série de aflições e vexames e terminam por destruir o que há de mais elevado no ser. Coloca-se em salvaguarda contra as facilidades morais que anestesiam os centros do discernimento, por mais favoráveis se lhe apresentem, ou mesmo que se trate de um cabedal glorioso de transitória posição de relevo no mundo. Resguarda-se contra os vícios sociais, os pequenos crimes que são as matrizes dos grandes fracassos espirituais. Afirma os seus valores legítimos, não pelo envilecimento da personalidade, porém através da manutenção dos requisitos que o tornam verdadeiramente digno de ser respeitado e imitado. Não aquiesce diante da mentira, da inveja, da embriaguez, da concupiscência, da calúnia, dos tóxicos, estabelecendo uma normativa de comportamento que lhe constitui a couraça de segurança, ao mesmo tempo abrindo as portas da liberdade por onde avança resoluto, na marcha que o conduz para a paz.

         Enquanto medram as licenciosidades, que vão, a pouco e pouco, dominando o homem e a sociedade hodiernos, o cristão verdadeiro sabe que  a sua segurança é Deus, seu melhor amigo é Cristo, seu roteiro de saúde é o Evangelho, sua definição é o Bem, sua metodologia é a Caridade, sua salvação é    o Amor.

Sem qualquer pieguismo ou manifestação de covardia moral, estabelece um estado de paz interior que os conflitos e as convulsões de fora não conseguem invalidar.

Caracteriza-se a degenerescência de um povo, a queda de uma comunidade pela incursão aberrativa das permissividades morais que neles se instalam. Quando combalem os valores éticos, desmoronam-se os alicerces da vida humana.

Verdade é que muitas vezes se tornam legais as excrescências do caráter humano. Apesar disso jamais se tornam morais.

Aqueles que compactuam com as licenciosidades douradas são também criminosos que se unem para os homicídios recíprocos da vida interior. Enquanto vibram, estonteantes, em sensações enganosas, as expressões do prazer, na atualidade do sexo que tresvaria, vão fazendo do homem um feixe de instintos animalizantes e da mulher um objeto de uso indiscriminado. Sem desejar referir-nos aos grandes comprometidos da História, não podemos sopitar referências a alguns deles, como Cláudio e Messalina que, não obstante a posição relevante à testa do Império Romano, entregavam-se à exaustão dos sentidos, culminando pela alucinação do desejo infrene e da degeneração mental; Justiniano e Teodora - esta última uma atriz arrancada do bordel para o primeiro ponto de destaque da comunidade - exerceram lamentável influência, inclusive na Religião... Mais recentemente Paulina Bonaparte que, tendo o irmão à frente do Império Francês, entregou-se à volúpia insana do prazer até o total aniquilamento das forças... E quantos outros?!...

Seria difícil eleger os grandes prevaricadores e as coquetes da contemporaneidade. É verdade que a mulher envilecida em seus sentimentos, pelo rebaixamento na sexualidade, ascende em posição social, despertando inveja, provocando ciúmes, mas, no íntimo, é uma infeliz, vitimada em si mesma. Espírito sofrido, que foi ludibriado nos seus anseios mais profundos, jornadeia nas luzes enganosas da glória, que logo se apagam, sem contar com um braço amigo que lhe conceda dignidade e apoio quando as carnes trôpegas perderem o momentâneo viço, e o fulgor dos olhos apagar a sua luminosidade. Poderá estar ajaezada e adereçada de gemas de alto custo, todavia sempre experimenta o travo profundo da soledade e o ácido tormentoso do sacrifício sem amor. Se lhe veio das carnes um filho, órfão de pai vivo, terá que segurá-lo em transe de dor, num misto de mágoa, amor e agonia tão profunda quão devastadora. Se derrapa na miséria econômica, que muitas vezes precede ou sucede à moral, passa combatida, combalida, com a ferida aberta do sentimento ultrajado, onde o veneno da insensatez humana aumenta cada vez mais a pústula, tornando-a mais dolorosa. Ninguém dela se apieda. Desculpam o cômpar que contribuiu para a sua queda, mas não a ela que tombou. Em verdade, poucos lembram de que a sua queda se consumou porque u´a mão anônima e acovardada empurrou-a pela escada abaixo da indignidade, constrangendo-a a recolher-se na própria vergonha.

Os vícios, que são frutos dos distúrbios da emotividade, da insegurança e das ambições desnorteadoras deste século de misérias e de glórias, de despudor e de renúncias, objetivam o saciar do egoísmo na sua multiface de paixões.

Não vos deixeis enredar nas malhas bem entretecidas das ações destrutivas dos vícios, por mais simples que vos pareçam!

A barragem poderosa que sustém as águas, arrebenta-se, quando uma pequena infiltração lhe mina as resistências. As pirâmides colossais levantaram-se pedra sobre pedra. A escada da degradação dos costumes começa no primeiro passo para baixo e não encontra fundo, porque, quem cai moralmente e se deixa derruir, tomba sempre um degrau a mais.

Detende vosso passo e erguei vosso sentimento!

O melhor conselheiro do ser é a consciência tranqüila.

Inutilmente procurar-se-ão psicoterapeutas, analistas, medicações, se não se erradicarem do sentimento profundo as marcas dos crimes perpetrados contra a consciência pessoal ou coletiva.

Analisai o Evangelho, comprometendo-vos com ele e, livres como sois, não useis da vossa licença para destruir a oportunidade da atual reencarnação.

O Apóstolo Paulo gritava com emoção que era escravo do Cristo; João da Cruz, o místico espanhol, entregando-se totalmente ao Mestre Galileu, tornou-se o protótipo do senhor de si mesmo, e Teresa d'Ávila, que com ele compartia as excelências espirituais, escreveu emocionada: "Me muero, por que non muero", a sofrer, porque não morrer para ela constituía verdadeiramente uma forma de morte.

O homem que encontra Jesus e que O segue rompe a grilheta que o ata aos vícios dissolventes, sempre nocivos ao coração.

Avançar com o espírito estóico no rumo da felicidade íntima, através da retidão do caráter e da preservação dos costumes, é a diretriz que vos chega, com o objetivo de edificardes, no mundo, uma humanidade melhor, onde todos encontraremos a verdadeira paz hoje ou amanhã.

 

FRANCISCO DO MONTE ALVERNE

 

(Mensagem psicotônica recebida pelo médium Divaldo P. Franco, na reunião da noite de 22-11-1978, no Centro Espírita "Caminho da Redenção", em Salvador-BA.)

 

 

Revista Reformador – Fevereiro 1978

 

publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 00:01
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Sábado, 08 De Janeiro,2011

VONTADE

Dentre tantos atributos essenciais da alma humana tais como livre-arbítrio, consciência de si mesma, inteligência, racionalidade, percepções, a vontade é, inquestionavelmente, um dos principais.

O ser humano, embrutecido em suas origens, tem sido ajudado a caminhar na esteira do tempo por sua vontade. Das brumas do passado aos dias atuais aprendeu a discernir e poder alcançar o senso moral mas ainda hoje não conseguiu adaptar-se à observância das leis naturais. Caminha em largas passadas em inteligência, porém arrasta-se lentamente em moralidade. Transgride reincidentemente as normas divinas, notadamente o postulado universal do amor ao próximo descerrado ao Mundo pelo Divino Mestre. O cediço hábito de ferir é ainda frequente entre as pessoas.

Jesus desceu das luzes do infinito para viver entre os homens arrostando imperfeições, e aflições de toada ordem, sem jamais deixar de tolerar incompreensões, de socorrer, aliviar, curar e encaminhar as criaturas no meio das trevas mais densas do Planeta. Para implantar no solo da Terra a Sua Doutrina recomendou a seus discípulos: “Ide e pregai”.

Hoje, próxima do terceiro milênio da Era Cristã, a Humanidade necessita urgentemente assimilar as verdades da Doutrina Consoladora e Esclarecedora por Ele enviada para se libertar do erro, da ignorância, dos sofrimentos. Fincada definitivamente a bandeira do Espiritismo Cristão, incumbe a seus adeptos conscienciosos espalhar as luzes da sublime candeia da Nova Revelação sob o lema de Deus, Cristo e Caridade.

O Espiritismo é a senda da verdade, a luz que clareia a via do destino. As almas desviadas dos rumos do bem se entediarão de errar e sofrer e serão despertadas do longo letargo da ignorância e das maldades. Suas vontades as conduzirão aos pagos onde se edifica o bem. As que obram com Deus encontram o lenitivo para os sofrimentos, a medicação contra os males.

A sociedade humana exibe muitas chagas morais abomináveis: o egoísmo, a cobiça e ambição delirantes, as guerras, a violência de várias feições, o consumo e o mercado de drogas, vícios e desregramentos diversos, e tantas outras. A descrença em Deus, o desconhecimento de Suas leis fazem com que os portadores dessas nódoas ignorem que têm encontro marcado com a Soberana Justiça Divina.

Por outro lado, grande parte dos homens se esquece de que pequena parcela do supérfluo do que possui é suficiente para minorar a fome, amparar crianças órfãs e desvalidas, idosos desprotegidos e vítimas dos infortúnios. A dureza dos corações é, muitas vezes, o carrasco do erro e da injustiça. Bastaria que se unissem as vontades de socorrer, não com simples esmolas, mas com a ajuda efetiva ou seja, o desejo de cumprir o dever de fraternidade. A certeza da vida futura e a consciência de que somos irmãos, filhos do Pai eterno, sustentam os esforços nesse sentido.

Nossas ações devem estar voltadas para o futuro. Não devemos perder de vista em nenhuma delas que as suas consequências são inexoráveis. Passado, presente e futuro são sempre solidários. O porvir mais próximo ou mais distante nos reserva o efeito das nossas práticas de hoje, isso rigorosamente em decorrência do bem ou do mal que delas resultem, tudo de conformidade com as leis da Divina Providência.

A descrença na vida futura é uma das principais causas do egoísmo, do orgulho e das vicissitudes deles decorrentes. Quando as pessoas somente praticarem o bem não haverá necessidade dos resgates dolorosos. Numa sociedade fraterna em que todos se ajudarem mutuamente, todos serão venturosos. Isso não é utopia. A razão pura nos informa que é perfeitamente realizável. Para tanto o imprescindível é a evolução, a educação em sentido amplo a nos conduzirem às verdades da existência de Deus, da imortalidade da alma, das vidas sucessivas, das leis naturais.

Pelo progresso já feito verifica-se, sem dificuldade, que a evolução não tem termo. Fácil é, pois, entender que há mundos ditosos onde impera a fraternidade e a prática do bem é usual, sendo os sofrimentos limitados à transformação natural da matéria, excluídos, portanto, os resultantes da prática do mal.

Desde que se alcance a consciência da verdade, o desejo de progredir é a poderosa alavanca da evolução e quanto mais se oferece à vida mais ela devolve.

A expressão da vontade varia de um para outro indivíduo. Sendo manifestação da alma revela-se de acordo com o seu grau de adiantamento. Na erraticidade pode não ser a mesma a vontade do Espírito quando encarnado, podendo, também, ser superior às suas forças.

A vontade dos maus está costumeiramente voltada para a inveja, a cobiça, a vaidade, para as más tendências, valendo notar, contudo, que não há seres votados permanentemente ao mal, como entendem algumas crenças, o que atentaria contra a Justiça e a Sabedoria das leis naturais.

Submeter-se à vontade de Deus é o meio seguro de incrementar o progresso, vencer as provas e expiações. Devemos, pois, nos esforçar para aproximar da d’Ele a nossa vontade, já que essa comunhão de propósitos somente nos fará ditosos.

A Doutrina Espírita ensina também que a vontade do Espírito se modifica à medida que ele evolui, podendo apressar ou retardar o próprio progresso.

Bem ou mal dirigida, a vontade gera alegrias ou arrependimentos. Incumbe a cada criatura, portanto, esforçar-se para se aproximar das virtudes, absorvê-las e cultivá-las a fim de sentir a abençoada presença divina em sua vida. O amor, sumário de todas elas, é o agente e o poder capazes de construir e sustentar a vida, de fecundar e fertilizar a alma.

Muitas vezes as pessoas perdem o ânimo de viver por motivos e razões variados. Chegam mesmo a atentar contra a própria vida. Isso constitui afronta gravíssima às leis de Deus a proporcionar padecimentos futuros angustiosos.

Por outro lado, imenso contingente humano tem pavor da morte, quase sempre devido à descrença na vida futura. Santo Agostinho nos lembra que morremos todos os dias. A morte é, na realidade, a passagem para uma vida melhor sob o ponto de vista de que nos livra dos males da matéria. Contudo, não nos livra dos sofrimentos. Para o homem de bem a morte é ensejo de júbilo que o corpo físico não pode proporcionar. A morte é para os bons o encontro da paz enquanto que para os que se desviam do caminho do bem significa a entrada para o suplício.

As pessoas marginalizadas da sociedade, crianças, adolescentes e adultas, que vagueiam pelas vias públicas em grande número, espalhadas pelos recantos da imensa Nação Brasileira, compõem um quadro de penúria. Muitas, estiradas no chão da Pátria, sem teto e sem alimento, em situação degradante, inferior mesmo à dos animais irracionais. Estômagos vazios ulcerados pela carência de alimentação, pulmões minados pela fome, o corpo exibindo chagas. Já não se trata de pobreza aquela que acompanha o homem há milênios, mas de absoluta miséria. Todas as vistas devem voltar-se para essa realidade aviltante. Há necessidade urgente e imperiosa de enfrentar essa questão, fazer cessar a indiferença, pôr cobro em tal situação ou pelo menos minorar tal degradação.

Criam-se programas e impostos, destacam-se verbas para outras destinações, mas esse problema não tem sido solucionado nem mesmo considerado, não faz parte do sentimento das criaturas, não há vontade de resolvê-lo. Não se trata de retirar das ruas desocupados e mendigos para que não criem embaraços à vida e aos olhos dos transeuntes. Trata-se de encarar um realidade que atenta contra a dignidade da pessoa humana. É tema que diz respeito a todos, governantes e governados, religiosos ou não. A comunidade inteira tem obrigação irrecusável de dar solução a essa questão, venham de que fonte for os recursos necessários.

Queiram ou não os orgulhosos e os insensíveis, essas criaturas em infamante miséria são nossas irmãs e como tais devem ser consideradas e tratadas. Que se tribute com eqüidade a coletividade, até mesmo os próprios beneficiados, mas que encontre termo esse panorama desolador que envilece qualquer civilização.

Nem só de pão vive o homem. Entretanto, não se pode nem pensar em fazer discurso ou pregação de qualquer natureza ou procedência para os que têm permanentemente o estômago vazio e o corpo dilacerado pelos pedrouços da vida. É inelutável a necessidade de combate às causas profundas que dão origem a esses quadros tristes. Mas não há como esperar os resultados de outras medidas que possam ter repercussão sobre esses casos. O socorro e o amparo a essas criaturas devem ser urgentes. Quem não prestar colaboração nesse sentido está cometendo infração moral contra a Humanidade.

Neste momento não devemos levar em consideração se merecem ou não ser socorridas todas essas criaturas. Embora saibamos da existência das que preferem morrer na indigência a trabalhar, jamais devemos esquecer que também essas devem ser socorridas, eis que são portadoras de enfermidades da alma e que, por sua vez, serão um dia curadas. A distribuição da infalível justiça cabe às leis de Deus. A nós, filhos do Senhor da Vida, segundo as mesmas leis, incumbe a prática da caridade. .

Reformador Jan.99

publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 19:33
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Quarta-feira, 05 De Janeiro,2011

NÃO JULGAR

“Não julgueis, a fim de não serdes julgados; porquanto sereis julgados conforme houverdes julgado os outros; com a medida com que medirdes sereis medido. “ Jesus. (MATEUS, 7:1-2.)

Julgarmo-nos uns aos outros tem-se constituído um forte hábito através dos tempos. Tal hábito encontra-se registrado na história da Humanidade, no seio de todos os povos e na utilização de todos os idiomas. Ressalta-se, ainda, na obra de todos os poetas antigos e modernos, desde Homero a Shakespeare, e sobreleva-se nos autores contemporâneos.

A ação de julgar é conseqüência natural da ação de raciocinar. E decorre de dois fatores: discordar e refletir. Por isso que os seres irracionais não julgam, pois lhes falta a razão: desenvolvem apenas o instinto, que não lhes permite pensar.

É verdade que o instinto, por evolução, se transformará futuramente em inteligência, pois constitui a base ou fundamento dela, depois da grande e sublime metamorfose ou nascimento espiritual.

Antes desse nascimento, deverá o ser passar por estado de depuração, em que precisará perder a “lembrança” instintiva de suas relações com a matéria, em que o irracional aprendia a distinguir determinadas coisas, como o melhor meio para a sua sobrevivência, a melhor água para beber, o alimento que melhor lhe conviesse, etc. E isso já se nos afigura uma forma incipiente de juízo, em determinadas espécies animais.

A ação de julgar é, portanto, inerente ao ser já a partir do instante em que se fez Espírito dotado da razão e com a faculdade de conhecer e de compreender o meio que o cerca, o que o torna inteligente e capaz de pensar.

Julgar é, pois, uma ação natural, normal e imprescindível no Espírito, encarnado ou desencarnado, do que podemos concluir que o Cristo não nos nega o direito de julgar e sim nos adverte contra o julgamento impróprio ou irresponsável, a censura injusta ou leviana a respeito dos outros.

O Espírito é dotado de cinco faculdades essenciais e fundamentais à sua condição de ser ou ente criado à imagem e semelhança de Deus. São elas:

1. Inteligência - condição de entender, conhecer e compreender o ambiente que o cerca ou meio em que vive e onde precisa desenvolver-se; tal faculdade lhe oferece ainda a percepção relativamente fácil das coisas.

2. Razão - condição que lhe outorga o poder de aprofundar-se no conhecimento das coisas, compreender determinados fatos, discernir, perquirir e, com a utilização da inteligência, criar e inventar.

3. Juízo - faculdade intelectual de manter-se cuidadosamente dentro de determinados limites de sua própria capacidade de auto-avaliação ou critério a respeito do que lhe for dado examinar.

4. Livre-arbítrio - poder de se autodeterminar.

5. Consciência - sentimento do que se passa no indivíduo, em seu íntimo e em sua natureza; é testemunha e ao mesmo tempo juiz incorruptível e severíssimo da própria alma, que aprova as boas atitudes e rejeita as más.

Na ocasião em que Jesus se expressou sobre a ação de julgar, o homem israelita ignorava essas coisas do ponto de vista filosófico. Era dotado de todas essas faculdades mas as desconhecia como potências da alma que se interagiam na disciplinação do ser como criatura de Deus.

O homem hebreu era capaz de perceber o erro que outro praticasse, mas não conseguia dimensioná-lo em si mesmo. Daí a advertência do Mestre dos mestres: “Vês o argueiro no olho de teu irmão e não percebes a trave no teu olho!"

E era verdade. Vejamos o caso da mulher adúltera (João, 8:1-11). Ela não adulterou sozinha; nem mesmo se sabe se não foi induzida ao adultério com o propósito de conduzirem o Cristo a contradições e perda. Mas, o que nos impede supor que todos os perseguidores da infeliz mulher fossem também adúlteros e não sabiam, uns por hipocrisia, outros por ignorância mesmo?

Em nossos dias, porém, em sociedade, já a ninguém é dado o álibi da ignorância, tendo em vista o adultério haver tomado a característica simplória e cínica de moda, de luxo e fatuidade viciosa. Por outro lado, o desquite e o divórcio são, muitas vezes, pretextos para a troca de parceiros no processo conjugal, onde a prole é instruída a tudo aceitar como fato normal.

Será que não estamos exagerando ou julgando mal o nosso próximo e a sociedade? Não!

Pois que esses fatos estão documentados nas colunas sociais.

Na época do Cristo, entre os homens imperava a maledicência. Julgava-se até sob o testemunho de Deus: Disse Jesus, parabolicamente (Lucas, 18:9-14), que dois homens subiram ao templo para orar, um era fariseu, o outro, publicano. E o fariseu orava assim: “Ó meu Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem mesmo como esse publicano...” (que lhe estava ao lado). Nem Deus era poupado na hipocrisia dos homens, pois se um fariseu assim agia, imaginemos a totalidade!...

Deixemos o homem de ontem e voltemos as nossas atenções para o de nossos dias, em que a Humanidade parece agir como se de Deus houvesse esquecido inteiramente ou Ele houvesse deixado de existir.

Jura-se inocência, em nome de Deus, até nos tribunais, mesmo diante dos libelos acusatórios mais evidentes... Calunia-se o próprio Criador para justificar as mais torpes ações de corrupção...

Mata-se todos os dias... Finalmente, nenhum dos mandamentos da lei exarada no Sinai é cumprido.

E os chamados pecados de que a história das religiões trata quando fala de Sodoma e Gomorra são atos pueris, tolos, infantis diante do que hoje se pratica, abertamente, nos mais diversos recantos deste pobre planeta.

Repetimos: não é julgamento inserto na advertência do Mestre incomparável. São fatos que estão à vista nos jornais, nas capas das revistas, na televisão e no rádio. São atos de devassidão, de depravação, de hediondez, de ódios... E que, no entanto, a sociedade contemporânea pratica e aceita como normais, corretos e naturais.

No instante em que laboramos na composição deste trabalho, a esposa nos chama a atenção para notícia tristíssima de mais um crime que foge a tudo o que se possa colocar na condição de hediondez. Noticia a televisão que cinco jovens - um de 16, outro de 18 e três de 19 anos incendeiam um homem que, em Brasília, nossa Capital Federal, encontrava-se deitado num ponto de ônibus. Era um líder indígena que possivelmente se perdera de seus companheiros e, ali acossado pelo sono, buscara repouso. Mas, qual não foi nossa surpresa, quando, no dia seguinte, já presos, procuravam justificar-se que não sabiam que era um índio pataxó. Julgaram tratar-se de um mendigo!... Veja, leitor e irmão espírita, que não exageramos nos conceitos acima, pois, no caso em foco, não temos bandidos ou assassinos vulgares mas cinco jovens filhos das melhores famílias da sociedade brasiliense. Por quê? Que é que está faltando ao homem planetário?... Apenas uma coisa: espírito de religiosidade calcado na Luz do Evangelho do Cristo.

Não estamos querendo dizer com os nossos argumentos que a advertência do Cristo, quanto à ação de julgar, esteja superada. Muito ao contrário. Acresce, hoje, à responsabilidade do julgador o dever de discernir bastante, mormente no que tange à necessidade de considerar melhor o valor da família, quer como centro de formação moral, quer com célula-base da sociedade.

Vejamos como sobre a ação de julgar o Mestre se pronuncia: “Não julgueis segundo a aparência, mas julgai segundo a reta justiça” (João, 7:24). E mais adiante, ainda no livro de João (12:47). “E se alguém ouvir as minhas palavras, e não crer, eu não o julgo; porque eu vim, não para julgar o mundo, mas para o salvar. “ Mais adiante, ele explica o porquê: quem rejeitar a sua palavra, já tem quem o julgue: sua própria consciência.

Ora, que somos nós? que são os Espíritos, que ajudam o mundo dos encarnados com as suas mensagens? Somos uns e outros porventura juízes? Que diz a Espiritualidade Superior a nosso respeito e do papel que nos cumpre desempenhar, desde que dele estejamos compenetrados?

Não somos juízes. Não nos compete lavrar sentenças contra quem quer que seja. Mas não estamos impedidos de ajuizar, tendo em vista a excelência de nosso papel, quer de arautos na pregação, quer de exemplificadores na conduta cristã. Nisto convém que sejamos discípulos autênticos do Senhor.

Em cada um de nós, nesta exercitação do Evangelho, deve haver uma profunda interação que compreenda razão, inteligência, juízo, consciência e livre-arbítrio, enquanto espiritistas. Temos o dever de tomar conhecimento das dores do mundo, mas atentos a uma postura de oração e fé, exemplificando fraternidade e disciplina, numa atitude indemovível de Amor.

Ao mesmo tempo, porém, que nos contristamos com todos os fatos desairosos vistos acima, fazemos uma certa empatia com aqueles que se candidataram e se candidatam, ainda, ao infortúnio espiritual e, quem sabe (?), ao expurgo deste planeta para mundos em condição evolutiva condizente com o empedernimento em que se encontram.

Não nos assiste, efetivamente, o direito de julgar quanto ao destino desses irmãos.

Percebemos a hediondez dos fatos, a iniquidade dos atos, a impiedade dos sentimentos. Mas nada sabemos a respeito das razões íntimas que os impulsionaram a delinquir e a se perderem nos desvãos das paixões e do erro. Somente Deus nos conhece, assim como conhece-se a si mesmo aquele que não se permitiu o entorpecimento da própria consciência...

A apatia para com os outros deve ser a conduta mental de um bom juiz e de todo aquele que se vê na contingência de assumir o compromisso de julgar. O Evangelho sugere perdão, complacência, misericórdia. Não obstante, perdão, complacência, misericórdia, enquanto atitudes, compreendem a existência de um erro ou falta já julgado, senão aceito como tal pela própria consciência do culpado.

O que ainda nos desafia o raciocínio é o entendimento, na ação de julgar, da advertência do Cristo: “Não julgueis.” Vejamos, então, o pensamento dos próprios Espíritos que se têm manifestado ao mundo na obra do Consolador.

Vejamos o raciocínio de Allan Kardec, no capítulo X, item 13 de “O Evangelho segundo o Espiritismo”:

“Não é possível que Jesus haja proibido se profligue o mal, uma vez que ele próprio nos deu o exemplo, tendo-o feito, até em termos enérgicos. O que quis significar é que a autoridade para censurar está na razão direta da autoridade moral daquele que censura. Tornar-se alguém culpado daquilo que condena noutrem é abdicar dessa autoridade, é privar-se do direito de repressão.”

(Grifamos.)

Um Espírito superior, no item 17 desse mesmo capítulo nos sugere:

(...) Não julgueis com severidade senão as vossas próprias ações (...)”.

E ensina-nos o Espírito São Luís a uma indagação do Codificador, no item 20, com bastante propriedade:

(...) A ninguém é defeso ver o mal, quando ele existe. (...) Aquele que note os defeitos do próximo o faça em seu proveito pessoal, isto é, para se exercitar em evitar o que reprova nos outros.”

Na obra “Os Quatro Evangelhos” (1º Tomo, 8ª edição FEB, pág. 472-473), o autor espiritual afirma que Jesus exortava seus discípulos a não julgarem levianamente e, mais adiante, ao explicar a questão da trave e do argueiro no olho, registra essas palavras a que igualmente destacamos, dada a sua importância:

“Depois então, quando fordes perfeitos, podereis censurar (julgar). Podereis, mas não o fareis, porque a perfeição das vossas almas vos terá aproximado daquele que, perfeição completa, disse: “Atire a primeira pedra o que dentre vós estiver sem pecado (...).”

A questão é mais séria do que a princípio se possa imaginar. Não é uma índole má que conduz as almas ao erro, ao crime, à iniqüidade, mas a imperfeição delas, a sua inferioridade moral.

No caso, por exemplo, do expurgo dos maus (obstinados) para mundos inferiores, o que ocorre não é uma condenação absoluta de Deus aos que não conseguiram aperfeiçoar-se e se mantêm enceguecidos na senda do mal, é uma questão de justiça. O Pai não considera justo que aqueles que atingiram um certo nível de perfeição fiquem sujeitos a uma espécie de estagnação planetária porque determinado contingente de Espíritos, por rebeldia, pouco caso fazem dos ensinos expressos na Lei e ratificados no Evangelho.

Sofrerão as conseqüências de sua obstinação. Quem os condena, Deus? Não! Para Deus não estão condenados mas reprovados. A consciência deles, sim, essa os condena. É sua função.

O mais severo dos tribunais!

Como interpretamos acima a consciência? Que a respeito dela dizem os filósofos e os pensadores? Repetem uns que é o juiz secreto da alma, que aprova as ações boas e rejeita as más; confirmam outros que é o juiz incorruptível e severíssimo do Espírito.

Retirar a trave do olho deve ser realmente “expurgar a alma de todos os vícios e tornar puro o coração.” Realizando este engenhoso salto da treva para a luz, apercebe-se o ser de que o erro, a maldade de seu irmão no trajeto evolucionista afigura-se-lhe simples argueiro no olho. E em tudo isso comprova-se a sabedoria do Mestre divino, ainda hoje incompreendido, e a grandeza do seu Evangelho, aguardando aplicação para que o reino de Deus se manifeste neste planeta.

Nosso planeta se aproxima do terceiro milênio da Era Cristã. Os que nele permanecerem serão comparados às virgens prudentes de que trata a parábola do Senhor no capítulo 25 do Evangelho segundo Mateus. E estarão em condição, finalmente, de compreender que Deus não pode contradizer-se ao mesmo tempo que nos ensina a perdoar, condenando irremissivelmente aqueles de seus filhos que, por imperfeição, se utilizam mal do livre-arbítrio. Serão expurgados da Terra, sim, já o dissemos, mas para, arrependidos, recuperarem-se e, purificados, prosseguirem no roteiro de sua evolução.

Inaldo Lacerda Lima

publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 13:32
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